terça-feira, 26 de novembro de 2024

A cor da noite

 I

A poesia é só um aspecto da vida. 

A carne também chama. 

As vezes andam juntas. 

As vezes apartam.

Lugares são especiais para quem atribui significado

E decide que são especiais. 

Lugares são só lugares.

Pessoas são só pessoas. 

Maçãs são iguais a maçãs. 

A vida é essa coleção de lugares.

Esse circo de pessoas aplaudindo o vazio.

Essa torre onde ninguém se entende. 

Esse cesto de maçãs carmesim.

A vida é só a vida.

Um filete de luz incandescente 

Que um fio desencapado apaga.

É o brilho que se perde numa chuva fina.

Qual a cor da noite de amor e fogo.

Qual a cor da distância. 

Qual a cor do relâmpago. 

Qual a cor do raio que mal se vê e já apagou.

A vida é essa coleção de cores, raios, relâmpagos, girassóis, distância e sonhos. 

O sonho é um farsante que finge que dança 

Por entre retalhos da fantasia de arlequim


II

O mundo está pintando cor de melancolia

Matizes desbotadas. Cores antigas.

 O mundo é goles, sinople, blau, sable.

Cor de goiaba, cor do sofá da sala, verde camuflado.

Vermelho-azul, purpura-sangue, rouge-rosado.

Punhal de prata nesse jardim

O mundo tem o cheiro do teu cabelo dourado 

A cor dessa noite é carmesim 


III

Por onde me levar a caminhada

Te levarei comigo 

Na subida longa

Na descida rápida

Na queda

No vôo para o sol

Te levarei comigo 

Te levarei comigo de arroubos 

De chofre, de chiste

Te levarei porque sou antigo

Sou hoje. Sou ontem. Sou o que resiste

Sou a noite do esquecimento 

Sou poeira na poeira do tempo

Sou o que se renova para manter-se velho 

Escrevo sobre lugares, pessoas, maçãs e momentos

Porque sim